Se uma linha contornasse a extensão do território brasileiro, ela teria 23.086 km. Desse número, o correspondente ao litoral, ou seja, a parte banhada pelo Oceano
Atlântico, seria equivalente a 31,91% (7.367 km). Somente a região Nordeste alcança 3.306 km, ou 44,87% desse total. Seguindo essa lógica, a Associação Brasileira dos Sebrae Estaduais (Abase) encomendou um estudo para mapear portos e aeroportos economicamente viáveis na região.
O documento aponta a ausência de uma rota marítima direta para a África e sugere a ligação entre o Ceará e o Cabo Verde como uma opção para alavancar o comércio do Nordeste brasileiro. O estudo da Abase mostrou que, para a rota ser viável economicamente, era necessário concentrar cargas em um ou dois portos do Nordeste e levá-las a Cabo Verde, explica o secretário executivo da Comissão de Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Ceará, José Roberto Marinho.
Até o momento, não há operações de carga regulares ligando as duas regiões. O que existiam eram rotas com transbordo, que são navios com mercadorias que param em vários portos brasileiros, seguem para as Ilhas Canárias e aguardam no pátio outros navios para repassá-las às entregas, explica José Roberto. Com a regularidade da rota, os produtores brasileiros esperam poder aumentar sua pauta de exportação e ir além dos produtos têxteis, higiene, construção civil e frutas.
Pontos positivos
Para o mercado, a República de Cabo Verde, com cerca de 500 mil habitantes, tem um potencial econômico pequeno. Mas dois fatores importantes entram em questão. A necessidade dessa rota existe não para suprir o mercado cabo-verdiano, mas sim de fazer do país um entreposto para dispersão para outras nações da África e outros países, como um hub marítimo, comenta o especialista em relações internacionais e consultor João Bosco Monte. Hub é uma expressão utilizada para se referir a um ponto de concentração e conexão.
Outro fator favorável ao ingresso de produtos brasileiros em solo cabo-verdiano pode ser o Tratado de Agoa. O tratado é um acordo entre Canadá, Estados Unidos, Europa e África pelo qual todo produto feito em Cabo Verde entra nesses países sem nenhuma barreira alfandegária, explica o superintendente do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) do Ceará, Carlos Cruz.
Para João Bosco, o Brasil pode se beneficiar do tratado. Há a possibilidade de que alguns produtos brasileiros sejam remanufaturados (até 30%) em solo cabo-verdiano e exportados, comenta.
A Holanda é um exemplo do como um país pode se beneficiar da posição de entreposto comercial. Com produção industrial modesta, ocupa a posição de um dos maiores exportadores do mundo devido a seus portos. Produtos do Nordeste serão levados para o mundo a partir dessa porta africana, prevê o superintendente.
Mercado e infraestrutura
Segundo Carlos, não há com o que se preocupar quanto à infraestrutura. Todos os portos estão preparados, tanto para receber, quanto para exportar. Só está faltando o navio armador, garante.
Fazem parte da negociação os portos de Mucuripe, federal, e do Pecém, estadual, ambos no Ceará. O acordo com a Empresa Nacional de Operação dos Portos de Cabo Verde (Enapor) já está fechado com Mucuripe, cuja vocação é para navios de pequeno e médio porte. Pecém deverá entrar em operação em uma segunda fase. Em Cabo Verde, a negociação está sendo feita com o porto de Mindelo, na Ilha de São Vicente. Dependendo do desempenho, o negócio pode se expandir. Já fizemos o trabalho que mostra a viabilidade, afirma Carlos.
Expectativas
Segundo José Roberto, a expectativa é de que o plano saia do papel ainda neste ano. O deadline é novembro, garante.
A regularização da rota vai beneficiar os empresários, segundo João Bosco. Com a regularidade, existe uma previsão, que é a segurança que o empresário precisa ter.
Outro benefício é a ampliação do mercado. Outras regiões vão começar a conhecer nossos produtos, analisa.
A decisão de operar a rota não é da Enapor nem da Companhia Docas do Ceará. Quem vai viabilizar a ligação é o proprietário do navio. Existem quatro armadores
preparando uma planilha de custos, conta José Roberto. Segundo ele, a análise da planilha deverá estar pronta em 10 dias.