Nos bastidores do governo – o que inclui Petrobras e Transpetro – costura-se um acordo que implique a transferência do controle acionário do maior estaleiro do país – o Atlântico Sul, de Pernambuco – à coreana Samsung.
Hoje, a multinacional tem apenas 10% desse megaestaleiro, que tem encomendas bilionárias, de 22 supernavios e sete navios-sonda. O controle é exercido por Camargo Corrêa e Queiroz Galvão, que entraram em um projeto pioneiro, financiado pelo Fundo de Marinha Mercante (FMM), mas parecem não ter interesse – nem vocação – em continuar no negócio.
O Atlântico Sul surgiu como uma espécie de projeto de governo, na era Lula. Diante de impasses com outros estaleiros, teve-se a idéia de se lançar um super-estaleiro, capaz de construir grandes navios e, além disso, democratizar regionalmente o setor, antes excessivamente concentrado no Rio de Janeiro – o que hoje não mais ocorre, pois, além de projetos em Pernambuco e Alagoas, há pólos crescentes no Rio Grande do Sul e projetos para a Bahia.
A descentralização só não é mais intensa porque Santa Catarina rejeitou o estaleiro de OSX, Eike Batista, que traria um pouco de poluição e muitos empregos ao estado e agora cresce de forma acentuada no Norte Fluminense. Quando pronto, irá superar o Atlântico Sul em capacidade de produção.
Um fato gerou grandes problemas para o Atlântico Sul: o navio João Cândido. Houve erros a começar pelo nome do navio, uma provocação infantil à Marinha do Brasil. João Cândido era um suboficial que liderou revolta contra a estrutura da entidade, o que a Marinha, sob qualquer governo, não aceita.
Problemas estruturais e de montagem fizeram com que o primeiro navio da Transpetro a ser lançado ao mar, o João Cândido, até hoje não fosse entregue. O segundo navio a ser lançado, o Celso Furtado, do Mauá, ficou com a láurea de ser o primeiro incorporado pela Transpetro. E, se houver mais atrasos, o segundo navio a ser entregue será o Sergio Buarque de Hollanda, também do Mauá.
No caso do João Cândido, observadores pessimistas garantem que o navio não pode navegar. Mas a maioria dos analistas do setor afirma que os problemas decorreram do excesso de soldagem exigido, pois o navio foi feito com mais blocos a serem montados do que seria natural.
A pressa de Lula para ter uma solenidade marcante – de recuperação da construção naval e de renascimento industrial no Nordeste – agravou esse fato, mas a maioria dos informantes garante que o American Bureau of Shipping (ABS) irá dar sinal verde ao navio. Com isso, o petroleiro ganha uma espécie de classificação AAA para a comunidade internacional, pois com aprovação de entidade classificadora internacional, um navio pode ser incorporado à frota alemí ou norte-americana sem ser submetido a qualquer teste.
Resta saber o que irá pedir a Samsung para assumir o estaleiro. Certamente, não irá querer desembolsar altos valores, ao contrário do que desejariam Camargo Corrêa e Queiroz Galvão.
Mas, como tem estaleiros na Coréia, a Samsung pode ser atraída pela possibilidade de receber outras obras do Brasil (Petrobras), o que lhe compensaria a árdua tarefa de reorganizar administração e setor técnico do Atlântico Sul. Tudo indica que o acordo pode ser fechado, pois Camargo e Queiroz colheram mais dissabores do que alegrias com o estaleiro pioneiro de Pernambuco.
Os estaleiros brasileiros não gostariam de ver obras prometidas ao mercado interno levadas para a Coréia, mas este pode ser o preço para pacificação do Atlântico Sul.