INTRODUÇÃO O contrato de afretamento por tempo é largamente o tipo de contrato de afretamento mais utilizado no mercado brasileiro, correspondendo a 70% dos afretamentos praticados no Brasil, de acordo com dados divulgados pela Agencia Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ. Os contratos de afretamento ligados à navegação de apoio marítimo correspondem a mais de 48% dos contratos praticados no mercado brasileiro. E chega a 97% o percentual de contratos de afretamento por tempo de embarcações brasileiras no segmento offshore. Esses dados são importantes para contextualizar o atual mercado brasileiro, onde, há predominância dos contratos de afretamento por tempo e concentração no mercado de offshore. Embora sejam adotados os contratos padrões ou formulários internacionais como o NYPE, GENTIME, e principalmente, o SHELLTIME nas navegações de cabotagem e longo curso, na navegação de apoio marítimo ainda é superior a adoção de contratos fora desses padrões internacionais e regidos pela lei brasileira. Hoje a PETROBRAS exerce o papel de principal afretadora brasileira, respondendo por mais de 77% dos contratos de afretamento por tempo atualmente em vigor e mais de 99% dos contratos de afretamento na navegação de apoio marítimo. Desta forma, considerando a relevância demonstrada pelos números acima, nos concentraremos na análise das principais cláusulas e termos dos contratos de afretamento por tempo adotados pela PETROBRAS para o apoio marítimo, mas antes passaremos pela definição de contrato de afretamento por tempo. 2. DEFINIÇÃO DE CONTRATO DE AFRETAMENTO POR TEMPO De acordo com a doutrina internacional, o contrato de afretamento por tempo (ou “time charter”) prevê a transferência da gestão comercial da embarcação para a afretadora, enquanto o armador mantém a gestão náutica. De acordo com definição da ANTAQ contida na Resolução 1811/10, o afretamento por tempo é aquele que em virtude do qual o afretador recebe a embarcação, ou parte dela, armada e tripulada, para operá-la por tempo determinado.Nesse sentido, no afretamento por tempo, o armador deverá colocar a disposição do afretador a embarcação e sua tripulação de forma a atender aos desígnios da afretadora com relação a utilização da embarcação, sempre dentro dos limites previstos no contrato. 3. A estrutura O contrato da PETROBRAS tem se modificado ao longo dos anos, de forma a se adequar a novas legislações e entendimentos das autoridades brasileiras. De fato, hoje existem em vigor no segmento offshore contratos da PETROBRAS com diferentes estruturas. Até alguns meses atrás, as licitações da PETROBRAS previam uma contratação por afretamento por tempo por meio de dois contratos com execução simultânea: (i) afretamento e outro de (ii) serviços. Ambos os contratos prevêem responsabilidade solidária entre as contratadas. Atualmente, em razão de decisões administrativas e regulatórias, a PETROBRAS voltou a adotar um modelo único de afretamento por tempo. É importante destacar que o segmento offshore ainda tem uma particularidade, os contratos relacionados a embarcações de construção. Para tais embarcações, em geral, ainda é adotada a estrutura de contratos de afretamento e serviços com execução simultânea, mas a diferença é que nesse caso o afretamento é, de fato, um afretamento por tempo clássico (incluindo a tripulação) e o contrato de serviços aborda apenas os serviços especiais de operação da planta ou equipamentos especiais a bordo. 3.2 Obrigação de Obter as licenças e autorizações necessárias para a operação Os contratos que envolvem a operação de embarcações estrangeiras merecem especial atenção com relação a obtenção das licenças e autorização necessárias para operação. Dentre estas merecem especial atenção por suas peculiaridades no mercado brasileiro, a autorização de afretamento da ANTAQ e liberação aduaneira da embarcação. Os modelos internacionais prevêem que a afretadora deverá ser responsável pela obtenção das licenças e autorizações necessárias para a operação da embarcação, bem como pelo pagamento de custos de importação eventualmente devidos. Até o recente advento do decreto presidencial n. 7.296/10, os contratos da PETROBRAS previam que tanto a autorização da ANTAQ, quanto a liberação aduaneira da embarcação para operação em águas brasileiras seria de responsabilidade integral do armador. Essa estrutura gerou diversos problemas com as autoridades brasileiras, destacando-se a ANTAQ e a DIANA (Divisão de Administração Aduaneira da Receita Federal), culminando com a permanência de diversas embarcações fora de operação por meses. Hoje, a PETROBRAS assume a obrigação contratual de obter a autorização de afretamento para embarcações estrangeiras perante a ANTAQ. Não obstante, o risco relacionado a tal autorização permanece com o armador, posto que a PETROBRAS se reserva o direito de terminar antecipadamente o contrato, sem a aplicação de qualquer multa ou direito indenizatório ao armador, caso tal autorização não seja renovada a qualquer momento. As responsabilidades relacionadas a liberação aduaneira e o pagamento dos tributos de importação permanecem com o armador. 3.3 Responsabilidade das Partes Usualmente este contratos de afretamento por tempo de embarcações de apoio marítimo elaborados pela PETROBRAS são regidos pela lei brasileira, especialmente no que se refere a atribuição de responsabilidade às Partes e também sua limitação. Pela legislação brasileira, o armador tem responsabilidade objetiva e integral por todo e qualquer dano que cause ao afretador, a carga ou a terceiros em razão das suas atividades (na forma do art. 927 do Código Civil), incluindo danos causados pela tripulação ou pela embarcação. Adicionalmente, não há qualquer limitação para tal responsabilidade, uma vez que o Brasil não ratificou as convenções internacionais sobre limitação de responsabilidade do transportador marítimo (Hague, Hague Visby and Hamburg Rules). De fato, o rigor da lei brasileira torna extremamente difícil e custosa a colocação de seguros para resguardar os riscos que o armador está assumindo perante esses contratos. De forma a mitigar essa exposição, a PETROBRAS geralmente adota em seus contratos a limitação a danos diretos e um valor máximo de indenização, que pode variar de 10% a 100% do valor do contrato. 4 CONCLUSÃO Não resta dúvida que o fato de não utilizarmos em nosso País modelos internacionais de contratos cujas cláusulas já tenham sido amplamente analisadas pela doutrina internacional gera maior insegurança para as partes envolvidas. Devido ao desconhecimento quanto à interpretação e aplicação pratica de tais cláusulas recomendamos muita atenção e cuidado na análise pelos contratantes brasileiros e estrangeiros. Juliana Pizzolato Furtado Senna – LAW OFFICES CARL KINCAID – Mendes Vianna Advogados Associados – www.kincaid.com.br