O acidente no campo de Frade, na bacia de Campos, operado pela empresa americana Chevron, que provocou o derramamento de 2,4 mil barris de petróleo, em novembro, pode levar a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) a impor novas regras às empresas que queiram perfurar poços exploratórios em áreas já em produção, visando atingir horizontes de profundidade como o pré-sal. Procurada pelo Valor, a ANP não confirma a informação, mas, segundo fontes que preferem não se identificar, há em curso um estudo para aumentar exigências para concessão de autorização de perfuração nessas áreas.
Uma dessas medidas seria obrigar as petroleiras a construir um revestimento interno até o topo dos reservatórios. Um indicativo de que a ANP busca mais rigor envolveu a própria Chevron: a agência não autorizou a petroleira a perfurar um novo poço no campo de Frade, também para atingir o pré-sal, cuja faixa se estende entre o litoral dos Estados do Espírito Santo e de Santa Catarina, numa área de cerca de 800 km2. Em nota à imprensa, a agência explicou que a nova perfuração implicaria riscos idênticos aos que originaram o vazamento. A ANP justificou a decisão com base em análises e observações técnicas que evidenciam negligência por parte da concessionária na apuração de dado fundamental para a perfuração de poços e na elaboração e execução de cronograma de abandono, além de falta de maior atenção às melhores práticas da indústria.
A Petrobras seria a mais atingida caso estas normas entrem em vigor. O Programa Varredura, coordenado pela Área de E&P da empresa, que visa identificar novos reservatórios em áreas já em produção, identificou 284 prospectos exploratórios nas bacias de Campos e no Espírito Santo, com volume recuperável estimado em 2,235 bilhões de barris de óleo.
Acidentes de proporções menores serão incluídos no plano, diz o secretário Martins Almeida
No último ano, a Petrobras interligou cerca de 30 poços produtores em mais de dez campos, entre eles Marlim, Roncador, Piranema e Caratinga. As novas descobertas estão no pós-sal e no pré-sal, na bacia de Campos. Os poços representaram um acréscimo de 50 mil bpd à produção.
Para o consultor em Energia e sócio do Centro Brasileiro de Infraestrutura, Adriano Pires, o que é preciso é uma fiscalização melhor. O governo deveria, primeiro, capacitar órgãos como a ANP e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para exercerem a atividade de forma adequada, diz.
De 2008 a 2011, a ANP gastou R$ 75,5 milhões na fiscalização das atividades do upstream (exploração, desenvolvimento e produção de petróleo e gás), o que representa 90,92% do total previsto nos orçamentos do perãodo. Neste ano, empenhou R$ 13,9 milhões até 30 de novembro para a função – 94% do orçamento do ano.
Pelo acidente em Frade, a Chevron foi multada em R$ 150 milhões: R$ 100 milhões da ANP, por não cumprir o Plano de Abandono de Poço e pela adulteração de informações sobre o monitoramento no fundo do mar; e R$ 50 milhões do Ibama. E o Ministério Público Federal em Campos (RJ) entrou com ação civil pública contra a empresa pedindo indenização de R$ 20 bilhões por danos sociais e ambientais e pediu à Justiça Federal que conceda liminar suspendendo todas as atividades da Chevron Brasil e Transocean, sob pena de multa diária de R$ 500 milhões.
Quanto ao Plano Nacional de Contingência, em elaboração há dez anos, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, informa que foi formada comissão interministerial para revisar os estudos. Temos que ter um plano que, de fato, corresponda às nossas necessidades e que funcione. Temos agora o pré-sal, coisa que não havia antes, destaca Lobão. O secretário de Petróleo, Gás Natural e Combustíveis Renováveis do Ministério de Minas e Energia, Marco Antônio Martins Almeida, explica que os ajustes são necessários para que o plano contemple, por exemplo, a atuação do governo em derramamentos de pequeno porte. O plano foi construído para acidentes de grandes proporções. Agora, acidentes de proporções menores devem ser incluídos, afirmou Almeida, em audiência pública na Câmara dos Deputados.
Para o diretor de Tecnologia e Inovação da Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe), Segen Esteffen, o país já tem condições de ter um plano eficaz. Temos recursos humanos, laboratórios de ponta e a Coppe tem toda a disposição para contribuir com o governo e agências reguladoras. A ideia é criar uma comissão independente que planeje os passos para a construção de uma estrutura técnica forte, que eventualmente deve ser na própria ANP, e que enfrente com maior segurança esse tipo de acidente, aponta Esteffen.
Hoje é a Petrobras quem elabora programas de contingência para cada uma das plataformas, mas o governo quer uma estratégia em nível nacional, com a atuação conjunta dos órgãos fiscalizadores e do meio ambiente.
Outra consequência do vazamento do campo de Frade pode ser o adiamento da oferta de novas áreas exploratórias. A 11ª rodada de licitações da ANP havia sido adiada para 2012, sob o argumento de se resolver a questão dos royalties. Agora, o temor é que o vazamento leve o governo a adiar mais a oferta de áreas offshore – a última rodada foi em 2008.