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Clippings - 05/10/10

Incentivo ao Conteúdo Local

Alberto Machado Neto, Diretor Executivo de Petróleo, Gás, Bioenergia e Petroquímica da Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos), fala em entrevista sobre o impacto econômico do aumento do incentivo ao conteúdo local por parte das empresas que atuam no setor petrolífero, além de citar como esse tema é tratado em países como Noruega, Reino Unido e Coréia do Sul

1X “Conteúdo local” é um tema recorrente, muito citado quando a Petrobras ou a Transpetro anunciam seus planos de negócios, referentes à construção de módulos, embarcações e plataformas. Qual o impacto econômico com o aumento do incentivo do conteúdo local por parte das empresas atuantes no setor?

O setor de petróleo e gás possui uma extensa cadeia de valor, que começa com a “oil company” e vai até ao fabricante da mais elementar matéria-prima. Isso é visto quando a empresa de petróleo contrata um EPCista ou um estaleiro, que contrata os fabricantes de equipamentos, que por sua vez, contratam os fabricantes de partes, peças e componentes, estes, contratam os fornecedores de matérias-primas.

Além disso, a engenharia permeia todo esse processo desenvolvendo projetos conceituais, básicos, executivos, de produtos, de fabricação, entre outros. Todos esses segmentos empregam pessoas qualificadas, que recebem salários de bom nível e consomem bens e serviços no país, gerando um forte efeito renda. Porém, quando importamos um navio ou uma plataforma, só o primeiro elo da cadeia de valor fica no país, todos os demais vão para outros países.

2X No Seminário que aconteceu no mês de julho, com o tema “Participação da Indústria Brasileira no Setor de Petróleo e Gás – Ações e Resultados, em São Paulo, o senhor falou sobre o histórico desse assunto na indústria nacional. Quais foram os principais pontos abordados no evento?

O motivador para a realização do seminário foi o Plano de Negócios da Petrobras para o perãodo 2010-2014, que contém metas de conteúdo nacional. Pairam inúmeras dúvidas sobre: o que é exatamente conteúdo nacional, como é calculado, quais os resultados esperados, como pode ser usado para o desenvolvimento do país, como foi usado no passado, o que pensa o governo a respeito, entre outras questões relevantes.

Assim, o seminário foi estruturado a partir de um histórico da evolução da indústria nacional começando no perãodo pós-guerra, com ênfase no importante papel desempenhado pela Petrobras na liderança da “construção” do importante parque fabril que hoje temos no Brasil, seguido de uma descrição das diversas ações pós-quebra do monopólio da Petrobras.

Por seu turno, a Abimaq apresentou dados referentes à competitividade de nossa indústria atual e prospectiva. A visão do governo foi mostrada pela ANP, cálculo do conteúdo local, e pelo BNDES, sobre a Política de Desenvolvimento Produtivo para o setor de petróleo e gás, com gestão a cargo daquele Banco.

3X Qual o questionamento mais recorrente nos cursos, seminários, palestras que regularmente a Abimaq participa promovendo esse tema para atender empresários da área de Óleo & Gás?

O questionamento que mais escuto nos eventos que promovemos é sobre a perda de mercado verificada pela indústria nacional em decorrência do aumento das importações.

4X A Petrobras, conforme recente declaração do Diretor da Área de Serviços, Renato Duque, afirmou que não vai comprar da indústria nacional se considerar as negociações em condições desfavoráveis de prazos e preços. O senhor concorda com esse posicionamento?

Concordo com a posição da Petrobras sendo, entretanto, importante entender melhor o que são condições desfavoráveis. No meu modo de ver, nem sempre o melhor preço de face representa o menor custo para a companhia e os prazos intermediários são variáveis gerenciáveis. Um empreendimento se faz em três ou quatro anos e vai operar por mais de 20. As decisões na obra vão afetar os custos durante toda a sua vida útil e é muito melhor para um usuário contar com fornecedor próximo.

Manutenção, peças de reposição, moeda de pagamento, condições de pagamento, riscos logísticos, tempos de transporte, entre outras, são variáveis mais facilmente controláveis quando o fornecedor é local. Adicionalmente, do ponto de vista do país, a análise envolve outras variáveis, como perdas na geração de emprego e renda e até mesmo de mercado para os produtos provenientes do petróleo, os quais, em alguns casos, chegam a cerca de 20% dos custos das matérias-primas de um dado equipamento.

Para itens recém-desenvolvidos, a questão é crítica, pois nenhuma empresa que está iniciando um processo é competitiva quando está competindo com fornecedores tradicionais. Quando a concorrência é internacional, a desvantagem em relação aos participantes estrangeiros também é agravada, pois esses, por estarem participando como exportadores recebem diversos incentivos de seus países de origem. Cada vez que uma proposta nacional não é competitiva, temos que analisar as causas e tentar buscar uma solução para que ela seja tratada com isonomia e se torne competitiva sem, obviamente, prejudicar a Petrobras.

5X Além do Brasil, que outros países produtores de petróleo também adotam políticas de conteúdo nacional? Esse pode ser considerado um dos pilares do desenvolvimento no setor?

Não acho adequado falar em “políticas de conteúdo nacional”. O conteúdo nacional é conseqüência, é medida de desempenho, é indicador para verificar se as práticas adotadas para o desenvolvimento da indústria local estão dando certo. As políticas de desenvolvimento devem agir nas causas que venham a viabilizar e, mais que isso, alavancar a instalação de um sólido, competitivo e sustentável parque industrial no Brasil.

De modos diferentes, diversos outros países adotaram medidas estruturadas para desenvolver suas indústrias com bons resultados. Como exemplos, destaco a Noruega, o Reino Unido e a Coréia do Sul. O caso da Noruega é emblemático por ter conseguido desenvolver sua capacitação industrial em menos de 10 anos. Pode ser considerada como exemplo de um país que, ao descobrir suas reservas de petróleo, soube traçar estratégias que a levou de importadora de tecnologia a líder global na exploração e produção, incluindo águas profundas.

O Reino Unido representa um caso diferente. Apesar de partir de uma indústria bem mais desenvolvida do que a da Noruega, aquele país passou a amargar significativa perda de competitividade. Assim, criou novos centros de tecnologia com a descoberta de petróleo em águas profundas, utilizando políticas públicas e ações da sociedade envolvida. Bastante diferente das ações norueguesas, mas não menos exitosas.

Já o caso coreano dá indicações de como desenvolver outros elementos da cadeia de E&P a partir de uma base empresarial precária e em condições adversas. A Coréia do Sul, apesar de não ter à época uma indústria petroleira relevante, foi capaz de criar uma indústria naval a partir do zero e atualmente é um dos maiores produtores de navios e plataformas de produção em águas profundas no mundo.