unitri

Filtrar Por:

< Voltar

Na Mídia - 15/09/22

Minuta de norma sobre fiscalização tem pontos de melhoria, avaliam advogados

 

Arquivo/Divulgação Antaq

Texto da norma da agência reguladora foi objeto de crítica de representantes das principais associações do setor, prevalecendo um ‘tom favorável’ ao abrandamento das penas e de aplicação da proporcionalidade na imposição das sanções administrativas

A Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) realizou, recentemente, audiência pública sobre o aprimoramento da proposta normativa relacionada aos procedimentos administrativos que regulam as atividades de fiscalização, sob competência da autarquia. O processo recebeu contribuição do setor regulado, que enxerga pontos de melhoria. Para advogados ouvidos pela Portos e Navios, existem aspectos a serem ajustados na minuta para reduzir a insegurança jurídica, como também algumas evoluções nas regras, como no dispositivo de fiscalização responsiva.

O especialista em Direito Público e Contratual, mestre em Direito Político e Econômico,José Carlos Higa de Freitas, observou que o texto da norma disponibilizada pela agência reguladora foi alvo de críticas por parte de representantes das principais associações do setor, prevalecendo ‘um tom favorável’ ao abrandamento das penas e de aplicação da proporcionalidade na imposição das sanções administrativas.

“Existem alguns avanços na proposta normativa, como a aplicação da chamada fiscalização responsiva, método a ser aplicado com o objetivo de modular os atos de fiscalização em ações baseadas no comportamento e histórico do regulado. Esse instrumento pode ter papel importante, na medida em que incentiva o cumprimento espontâneo dos preceitos de regulação portuária, pautando a atividade de fiscalização conforme a postura adotada pela empresa regulada”, comentou à Portos e Navios o advogado, que é membro da Advocacia Ruy de Mello Miller (RMM).

A especialista em Direito Marítimo e sócia do escritório Kincaid Mendes Vianna Advogados, Camila Mendes Vianna Cardoso reforçou que a minuta da proposta foi objeto de inúmeros comentários por associações de classe e pelas próprias empresas do setor. “Penas como interdição, por exemplo, geram uma enorme insegurança jurídica, se sua utilização não for bem específica. Nesse particular, penalidades genéricas – como danos ao meio ambiente – também podem permitir graves equívocos em sua aplicação”, avaliou a advogada.

Na visão de Higa, do RMM, existem pontos em que a proposta não caminha tão bem: “Observa-se, por exemplo, o artigo 23 inciso I, que prevê a possibilidade de cassação, quando constatada a prática de ilícitos penais ou fiscais. Esse dispositivo parece extrapolar o âmbito de atuação da Antaq, atraindo a possibilidade de uma dupla punição e uma carga forte de insegurança jurídica”.

O especialista também avaliou que a nova norma traz alguns pontos que ‘beiram o contrassenso’, como a previsão de medidas cautelares voltadas à suspensão de certificados, licenças, operações, habilitações, autorizações ou demais liberações administrativas emitidas pela autarquia. “Nessa situação, ainda que esteja prevista somente a recomendação da cautelar pela fiscalização, que deverá ser confirmada pela Diretoria Colegiada da agência, em princípio, não se vislumbra os riscos iminentes aptos a justificar uma medida de tal natureza”.

Para Higa, nesse caso, o correto é a manutenção da possibilidade de recomendação desse tipo de medida, mas com a proteção e respeito ao devido processo legal, permitindo a aplicação desse tipo de penalidade somente ao final de um procedimento administrativo regular. Na opinião do advogado, outros pontos da proposta “padecem de obscuridade”, como a que prevê a utilização da Lei 9.784/1999, em relação à prescrição do exercício da ação punitiva da Antaq. “Ocorre que o referido diploma legal trata somente de uma hipótese de decadência em seu artigo 54, não havendo, portanto, qualquer referência à condição aventada nessa proposta normativa. E esse é um ponto que precisaria ser reformulado”.

Conforme Higa, a proposta normativa ainda utiliza muitos conceitos abertos, conferindo um alto grau de subjetividade na aplicação das penalidades previstas: “Dessa forma, acredito que seja salutar que os dispositivos fossem revistos, de forma a incorporar preceitos novos e importantes para a administração pública, como o de sopesar as consequências práticas de suas decisões”. Segundo o advogado, não basta apenas exigir que a fiscalização apresente a devida motivação, ou seja, cabe a motivação para que seja apresentada, demonstrando sua necessidade e adequação. “Cabe à agência reguladora indicar, desde então, parâmetros que possam ser utilizados para demonstrar a aplicação deste binômio”, sugeriu.

Higa disse que a proposta normativa, em discussão na Antaq, ‘flerta com o avanço’, quando traz o preceito da fiscalização responsiva: “Contudo, existem algumas inconsistências no texto apresentado, de forma que seja recomendável exaurir a discussão, em sede de audiência pública, observando todas as contribuições formuladas pelos agentes regulados. De forma ampla, a presença de conceitos abstratos exige que os procedimentos sejam detalhados com mais profundidade e com a finalidade de evitar possíveis abusos da fiscalização conferindo, assim, maior segurança jurídica a todos”.

O advogado avaliou que a mudança proposta não parece ter observado totalmente o papel da agência reguladora, que é a de buscar maior adesão aos seus preceitos, preservando não só o interesse público, mas também a convivência harmônica de usuários, arrendatários e autorizatários. “O objetivo em questão não será alcançado, se for mantido apenas o racional punitivo. Há de se estabelecer procedimentos de diálogo e incentivo, observando sempre o binômico de necessidade e adequação das medidas propostas”.

Procurada pela Portos e Navios, a Antaq não comentou o assunto até o fechamento desta reportagem. As contribuições da audiência pública 09/2022 poderão ser encaminhadas à agência reguladora até às 23h59 do próxima dia 30 de setembro.

Fonte: Revista Portos e Navios