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Clippings - 11/09/09

Novo risco às exportações brasileiras

Trata-se de uma ameaça potencial estimada em um terço de nossas exportações para os EUA, ou 4% de nossas exportações totais
Está em regime de tramitação veloz no Congresso dos Estados Unidos o projeto de lei Waxman-Markey (American Clean Energy and Security Act), o qual poderá impactar profundamente as exportações brasileiras e, portanto, merece a atenção especial do governo e da iniciativa privada.

O projeto, que já foi aprovado pela Câmara dos Deputados e agora está em tramitação no Senado, se baseia na criação de um sistema de comércio obrigatório de licenças de emissão de gases de efeito estufa do país -cap and trade- visando a sua redução em 3%, até 2012, em 20%, até 2020, em 42%, até 2030, e em 83%, até 2050, tendo 2005 como ano-base.

Do ponto de vista econômico, as discussões do Waxman-Markey têm como pano de fundo o conceito de vazamento de carbono (carbon leakage), pelo qual os custos a serem incorridos por empresas norte-americanas em razão de eventual mudança na legislação ambiental poderiam resultar na perda da competitividade e no consequente deslocamento da produção dessas empresas para fora dos Estados Unidos.
Para supostamente combater esses efeitos sobre a economia norte-americana, o projeto de lei Waxman-Markey traz duas medidas preocupantes para nosso comércio exterior: um programa de concessão de subsídios para indústrias norte-americanas intensivas em energia e expostas ao comércio e um programa que impõe como requisito de entrada no mercado norte-americano a compra de licenças por parte de empresas exportadoras de terceiros países. O programa de concessão de subsídios para indústrias norte-americanas, o Emission Allowance Rebate Program (Earp), funcionaria pela distribuição gratuita de até 15% das licenças de emissão a certas empresas que comprovem determinados níveis de intensidade de energia, intensidade em gases de efeito estufa e intensidade em comércio.

Na prática, como estão desenhadas as regras no projeto de lei, os setores subsidiados seriam concorrentes das empresas brasileiras em produtos químicos, siderúrgicos, cimento, papel e celulose, dentre outros. Já o programa que impõe como requisito de entrada no mercado norte-americano a compra de licenças por parte de empresas exportadoras de terceiros países, o International Reserve Allowance Program (Irap), cria uma reserva internacional de licenças de emissão a serem vendidas aos exportadores de produtos para os Estados Unidos.

Uma medida como essa gera efeitos equivalentes à imposição de uma tarifa de importação, uma espécie de border tax adjustment, no jargão da Organização Mundial do Comércio. A distribuição gratuita de até 15% das licenças de emissão poderia ainda configurar um subsídio proibido nos termos do Acordo de Subsídios e Medidas Compensatórias da OMC. Segundo a jurisprudência da OMC, seria necessário provar que as medidas adotadas não configurariam discriminação arbitrária e/ou injustificada ou restrição disfarçada ao comércio internacional. O Brasil está diante de uma ameaça potencial estimada, preliminarmente, em um terço de nossas exportações para os EUA ou 4% de nossas exportações totais.

Diante desse cenário, é importante ressaltar que diversos países cujas exportações serão prejudicadas poderão influir no processo, principalmente em três foros de atuação.
Primeiro, seria com uma atuação na Comissão de Relações Exteriores do Senado, tradicionalmente mais sensível a ponderações de terceiros países.
Outro foco seria uma atuação coordenada na conferência da ONU sobre mudança climática, em Copenhague, em dezembro, pois os temas comerciais ligados à implementação de um possível novo acordo internacional estarão na linha de frente das negociações. Vários países em desenvolvimento já se mobilizam pela inclusão de cláusulas que proíbam medidas do tipo border tax adjustment, como as propostas no Waxman-Markey. Finalmente, se o projeto for aprovado pelo Congresso norte-americano conforme se encontra, o governo brasileiro deverá se preparar para atuar no âmbito da OMC, ao lado dos demais países prejudicados pelas profundas implicações da nova legislação para o comércio global.
O projeto de lei Waxman-Markey poderá representar uma significativa mudança de paradigma da produção industrial no mundo, ao tentar reduzir os efeitos danosos da emissão de gases de efeito estufa. Mas esse objetivo louvável não pode se dar à custa do comércio exterior dos países em desenvolvimento e em descumprimento às regras multilaterais de comércio. Miguel Jorge, jornalista e ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior