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Clippings - 19/06/09

O financiamento das PPPs e os projetos de infraestrutura

Mesmo no presente cenário da crise econômica mundial, o Brasil, assim como os outros países da América Latina, deverá continuar a atrair investidores estrangeiros, principalmente no setor de infraestrutura. Apesar da recessão, as demandas crescentes da China e dos demais países emergentes da Ásia irão manter a pressão pelos investimentos em infraestrutura necessários para potencializar a exploração da riqueza mineral de commodities da região. Estradas, ferrovias, portos, aeroportos e linhas de transmissão requerem investimentos significativos.

Entretanto, a escassez de crédito tem produzido novos desafios, fazendo com que os agentes de mercado tenham de encontrar formas alternativas de financiamentos. As parcerias público-privadas (PPPs) deverão ter um papel primordial na busca por soluções para essas questões. Embora não ligada diretamente ao setor produtivo, a PPP da Linha 4 do Metrô de São Paulo certamente é um caso no qual diversas lições podem ser aprendidas. O projeto, que foi a primeira PPP a ser financiada com recursos estrangeiros, obteve seu primeiro desembolso no financiamento realizado no modelo de project finance, estruturado na forma de empréstimo A e B, com o Banco Inter-Americano de Desenvolvimento (BID) no auge da crise financeira, no fim do ano passado.

A estrutura se diferencia por envolver diversas legislações, o que acarretou em complexos contratos e negociações internacionais. A concessão e boa parte das garantias é regida pelo direito brasileiro. O contrato de fornecimento e sua cessão são regidos pela lei inglesa e o contrato de empréstimo celebrado com o BID, bem como o contrato de participação celebrado entre o BID e demais financiadores, são regidos pela lei do Estado de Nova York.
O projeto todo se baseia na concessão outorgada pelo Estado de São Paulo, pelo prazo de 30 anos, para manutenção e operação de um trecho de 12,8 quilômetros da linha amarela do metrô, entre Luz e Taboão. Trata-se de uma concessão patrocinada, inovação introduzida pela Lei nº 11.079, de 2004, pela qual passou a existir o regime das PPPs no Brasil. Assim como outras PPPs, além da tarifa cobrada do usuário pela utilização do sistema metroviário, há também uma contra-prestação pecuniária do governo.

A contra-prestação pecuniária é garantida pela Companhia Paulista de Parcerias (CPP), empresa pública de direito privado, constituída com ativos do próprio governo estadual para possibilitar a implementação das PPPs no Estado de São Paulo. Esses ativos são empenhados como garantia oferecida ao setor privado por parte do governo, até um determinado limite, que é ajustado periodicamente. Em relação ao projeto da Linha 4, garantias específicas foram prestadas na forma de títulos do governo federal que foram alocados em um fundo separado, o qual foi empenhado em favor da ViaQuatro – sociedade de propósito específico, concessionária da Linha 4 do Metrô de São Paulo – para garantir os pagamentos devidos pelo Estado de São Paulo, nos termos do contrato de concessão.

O regime das concessões não permite que os bens objeto da concessão sejam empenhados, uma vez que os ativos operacionais não podem ser objeto de execução por estarem vinculados a um serviço público. Além disso, os bens são considerados como reversíveis, o que implica que os mesmos deverão reverter ao poder concedente ao fim da concessão, para evitar que a prestação do serviço sofra qualquer solução de continuidade. Nesse caso, por tratar-se da primeira PPP a obter um financiamento internacional, as negociações acerca das garantias foram inovadoras e complexas. O pacote de garantias ofertado aos financiadores, além das garantias normalmente ofertadas em operações semelhantes, incluiu todos os instrumentos modernos de garantia disponíveis, dentre eles a vinculação dos recebíveis do fluxo de caixa do projeto, a cessão aos credores dos direitos contratuais da ViaQuatro, além de um contrato específico, regido por lei inglesa, prevendo o direito de entrada do financiador no contrato de fornecimento, ou step-in.

Ademais, o pacote de garantias incluiu a alienação fiduciária e o usufruto condicional das ações de titularidade da ViaQuatro, permitindo que, em caso de inadimplemento, os financiadores optem pela transferência das ações a terceiros, utilizando o produto de tal transferência para pagamento do empréstimo ou por exercerem temporariamente o step-in right, caso vislumbrem a possibilidade de reorganização financeira da ViaQuatro. Tanto o contrato de fornecimento como o contrato de concessão preveem que os conflitos serão regidos por meio de arbitragem, o que apresenta mais segurança e estabilidade aos financiadores.

A crise vem apresentando novos desafios aos investidores e a tendência é a de que reformas estruturais com o objetivo de garantir mais estabilidade no sistema financeiro mundial aconteçam nos próximos meses. Existe demanda para que grandes projetos sejam financiados por estruturas de project finance. Os países que não providenciam estabilidade com relação aos contratos e leis nacionais, políticas econômicas e transparência nas relações com setor público serão deixados de lado. Estes não estarão prontos para a inevitável recuperação da demanda global e de uma elevação no preço das commodities.