Neste ano, o Rio de Janeiro está sediando a cúpula do G20. O G20, ou Grupo dos 20, é um
fórum internacional que reúne as principais economias do mundo, incluindo 19 países e a União
Europeia. Criado em 1999, o grupo tem como objetivo promover a cooperação econômica global,
abordando questões financeiras e políticas econômicas de interesse comum. Entre os temas discutidos,
destacam-se o crescimento econômico global, a estabilidade financeira, as mudanças climáticas,
o desenvolvimento sustentável, o comércio internacional e a governança global.
Sob a presidência do Brasil, a agenda de proteção dos oceanos ganhou destaque significativo. Foi estabelecido o grupo de engajamento Oceans 20 (O20), que visa promover debates e formular recomendações
sobre a economia oceânica sustentável, preservação e conservação dos oceanos. O O20 é coordenado pela UNESCO para a Sustentabilidade do Oceano da Universidade de São Paulo, em colaboração com o Fórum Econômico Mundial, o Pacto Global da ONU – Rede Brasil e outras instituições.
O momento é, portanto, oportuno para destacarmos a relevância das Convenções Marítimas Internacionais.
As regulamentações marítimas retroagem a mais de 3.000 anos. Os fenícios foram pioneiros no
comércio de navegação e desenvolveram vários conceitos e princípios do direito marítimo. Com efeito,
o Código Marítimo de Amalfi regulou o comércio marítimo no Mar Mediterrâneo por mais de 300
anos. A Tabula Amalfitana, documento histórico datado do século XI, é considerado um dos primeiros
códigos de direito marítimo e desempenhou um papel crucial na regulação do comércio marítimo, estabelecendo normas para atividades como naufrágios, salvamento, seguros e contratos marítimos.
A Tabula Amalfitana inspirou a Ordenança Marítima Francesa de 1681, promulgada pelo Rei Luís XIV, que foi a base fundamental para todos os Códigos Comerciais subsequentes do século XIX, incluindo os códigos francês, espanhol, português, argentino e brasileiro. Contudo, o direito interno mostrou-se insuficiente para garantir segurança jurídica e promover o comércio pacífico entre as nações marítimas.
A necessidade de uma legislação uniforme dos mares tornou-se evidente com o crescimento do comércio marítimo internacional e transfronteiriço. A primeira metade do século XX foi marcada
por intensa atividade de organismos como a IMO, CMI e UNCITRAL, que promulgaram diversos
tratados, ratificados pela maioria da comunidade internacional.
A Convenção SOLAS, de 1914, foi a primeira convenção marítima, fruto de uma iniciativa da IMO após o trágico naufrágio do Titanic, que resultou em grande perda de vidas. Desde então, padrões de segurança tornaram-se uma prática obrigatória na indústria de navegação.
Atualmente, mais de um século após a primeira versão do SOLAS, existem mais de 150 convenções marítimas em vigor, abrangendo tanto o direito público quanto o direito privado. Estudos indicam que aproximadamente 60% dessas convenções permanecem não ratificadas por muitos países, entre eles o Brasil, que ainda apresenta um déficit significativo de ratificação.
Quando as primeiras convenções foram elaboradas no início do século XX, as questões ambientais e de sustentabilidade não eram prioritárias. Hoje, esses são temas inegociáveis e fundamentais. A saúde e a sustentabilidade dos nossos oceanos são essenciais para o bem-estar do planeta e de todos os seus habitantes. Como principais economias globais, os países do G20 têm um papel decisivo na proteção dos oceanos, por meio da adoção e implementação de iniciativas chave no âmbito do direito internacional.
Desse modo, o fortalecimento e a implementação dos acordos internacionais em matéria marítima parecem ser uma iniciativa essencial. Os países do G20 devem reafirmar seu compromisso com os acordos internacionais existentes voltados à proteção dos oceanos, como a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (UNCLOS) e a Convenção sobre Diversidade Biológica (CBD), além de outras convenções marítimas relevantes, tais como:
- SOLAS (Convenção Internacional para a Salvaguarda da Vida Humana no Mar)
- MARPOL (Convenção Internacional para Prevenção da Poluição por Navios)
- Convenção de Gestão de Águas de Lastro
- Convenção COLREG (Regulamento Internacional para Evitar Abalroamentos no Mar)
- Convenção de Remoção de Naufrágios (Convenção de Nairobi)
- Convenção de Salvamento
- Protocolo CLC e a Convenção do Fundo
- Convenção do Trabalho Marítimo – Direitos dos Trabalhadores Marítimos
Esses acordos internacionais fornecem uma estrutura essencial para a segurança no mar, prevenindo, por exemplo, o aumento das “frotas escuras” (dark fleets) e os riscos à navegação, promovendo a cooperação na conservação marinha, prevenindo a poluição por óleo no mar, viabilizando a gestão sustentável das pescas e protegendo a biodiversidade marinha. Os países do G20 devem assegurar a implementação efetiva desses acordos por meio de mecanismos aprimorados de monitoramento, relatórios e aplicação.
Outra iniciativa relevante consiste no fortalecimento das Redes de Áreas Marinhas Protegidas (AMPs). Os países do G20 devem trabalhar para estabelecer e gerenciar eficazmente uma rede abrangente de AMPs em suas respectivas zonas marítimas. As AMPs desempenham um papel fundamental na conservação dos ecossistemas marinhos, proteção de espécies vulneráveis e promoção da pesca sustentável. Os países do G20 devem colaborar para estabelecer AMPs transfronteiriças e reforçar as medidas de fiscalização para combater a pesca ilegal e outras atividades prejudiciais nessas áreas protegidas.
Ademais, a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (UNCLOS), também conhecida como Convenção da Jamaica, cobre diversos aspectos importantes do direito internacional do mar. Alguns dos principais temas abordados pela UNCLOS incluem:
- Delimitação de fronteiras marítimas entre países
- Regulamentação da poluição marinha
- Conservação e gestão de recursos marinhos
- Direitos de navegação e liberdades nos altos mares
- Mecanismos de resolução de conflitos relacionados ao direito do mar
As reivindicações de extensão da Zona Econômica Exclusiva (ZEE) – como a Amazônia Azul do Brasil – são regulamentadas e regidas pela Convenção da Jamaica, sendo este um mecanismo essencial para prevenir disputas sobre a exploração de recursos marinhos.
Em resumo:
Uma legislação internacional uniforme para os mares e a implementação das convenções marítimas internacionais são iniciativas cruciais pelos seguintes motivos:
- Clareza e consistência: Uma lei internacional uniforme dos mares ajuda a esclarecer os direitos e responsabilidades das nações em relação aos oceanos e mares, evitando conflitos e disputas entre países.
- Proteção dos recursos marinhos: Uma lei uniforme pode proteger recursos marinhos, como estoques pesqueiros e minerais, por meio de regras para uso sustentável e conservação.
- Navegação e comércio: Regras claras e consistentes sobre navegação e transporte marítimo são essenciais para o comércio internacional, garantindo o fluxo seguro de mercadorias e proporcionando uma estrutura para o comércio marítimo.
- Promoção da cooperação pacífica: Ao estabelecer regras comuns para interações em águas internacionais, uma lei uniforme pode promover a cooperação pacífica entre nações e prevenir conflitos sobre fronteiras marítimas e recursos.
Fonte: Revista InVerbis número 56