Após dois anos e meio de trabalho, que incluiu 32 reuniões e 13 workshops com a participação de cerca de 2 mil pessoas, o governo paulista concluiu um amplo diagnóstico sobre o que será necessário para colocar o estado no mapa das oportunidades da indústria de óleo e gás em tempos de pré-sal. O relatório final da Comissão Especial de Petróleo e Gás Natural do Estado de São Paulo (Cespeg) traz uma série de recomendações, ordenadas por prioridades, ao longo de 154 páginas.
O documento aponta como ponto favorável o fato de São Paulo abrigar 65% do parque industrial brasileiro fornecedor de bens, peças e equipamentos para o setor de óleo e gás. Além disso, estima-se a criação, até 2025, de 118 mil postos de trabalho no litoral paulista e outros 50 mil somente pela Petrobras. Os investimentos nesse horizonte deverão chegar a pelo menos R$ 176 bilhões.
Quanto aos desafios, a Cespeg os agrupou em macrotemas que vão da formação de mão de obra e questões econômico-fiscais até o desenvolvimento regional e infraestrutura, passando por inovação tecnológica, construção naval e desenvolvimento energético. Enfim, um cardápio de difícil digestão e que precisa ser enfrentado com urgência.
Para se ter uma ideia quanto aos impactos locais, Santos e região deverão receber, nos próximos 15 anos, algo em torno de 450 mil novos habitantes – ou seja, a população atual da cidade, segundo estimativas do IBGE. A arrecadação de receitas públicas é outro problema, se não o principal, levando em conta que, dependendo das decisões do Congresso Nacional em relação ao marco regulatório do pré-sal, a entrada de recursos poderá variar de fantásticos R$ 136 bilhões para esquálidos R$ 3,3 bilhões.
Todo esse trabalho de levantamento e proposições será analisado por uma comissão, a ser criada no âmbito do Programa Paulista de Petróleo e Gás Natural, lançado pelo decreto estadual 56.074 em agosto. A tarefa de colocar a mão na massa vai ficar para o governador eleito Geraldo Alckmin. As perspectivas são, em tese, favoráveis, já que foi da gestão de Alckmin na Secretaria de Desenvolvimento, no governo José Serra, a decisão de criar a Cespeg.
Gás de sobra
Do ponto de vista energético, será necessário encontrar uma solução para aproveitar o gás natural que virá do campo de Mexilhão, na Bacia de Santos. Calcula-se que a oferta do energético possa chegar à casa de 22 milhões de m³/dia já a partir do segundo semestre de 2011. A maior distribuidora paulista, a Comgás, entregou, ao longo dos primeiros oito meses de 2010, uma média diária de 15 milhões de m³.
A concessionária avisa que a demanda industrial, que andava reprimida há algum tempo, está bem melhor, mas ainda não voltou ao normal. Não só por causa do câmbio desfavorável e da crise do fim de 2008, que ainda está pegando no segmento de exportação de produtos com maior valor agregado. Também há sobras remanejáveis do segmento veicular, acossado de perto pelo etanol.
Por sua vez, a GasBrasiliano, responsável por toda a região noroeste do estado, veio marcando passo nos investimentos ao longo da última década e até agosto sua média diária não passava de minguados 639.649 m³. Com a Petrobras no comando da empresa desde maio, embora ainda falte o sinal verde da Arsesp, a agência reguladora local, espera-se que o plano de expansão da companhia seja ampliado e deslanche de vez.
Embora o preço do metro cúbico ainda seja um segredo guardado a sete chaves pela Petrobras, termeletricidade é uma das saídas enxergadas pelo governo paulista. Mas não se descarta um plano de universalização para o gás natural. Carlos Roberto Silvestrin, vice-presidente Executivo da Cogen-SP, acena com a possibilidade de instalação de 3.400 MW de plantas de cogeração. Para isso, uma das ações a considerar é a redução temporária, de 18% para 7%, do ICMS sobre equipamentos. Viabilizar o mercado de gás secundário e estabelecer a obrigatoriedade da instalação de ar-condicionado a gás em prédios novos próximos à rede de distribuição são outras medidas colocadas na mesa pela Cespeg.
Modelo de Imbetiba
São Paulo não está bem na disputa pela implantação de unidades de construção naval. Faltam áreas adequadas não somente para estaleiros como também para as demais instalações de apoio. A Avaliação Ambiental Estratégica das Atividades Portuárias, Industriais, Navais e Offshore do Litoral Paulista, um estudo alentado produzido pela empresa Tetraplan que identificou 136 locais de interesse, já está na Secretaria de Meio Ambiente. A expectativa era de que os resultados estivessem disponíveis ainda este ano, mas o Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema) assistiu à primeira apresentação sobre o tema em meados de novembro.
Entre as áreas com potencial para receber instalações estão o Dique do Furadinho (800 mil m²) e a Ilha Piaçaguera (600 mil m³), em Cubatão. Já na parte continental de Santos há um ponto próximo ao terminal da Fosfertil (380 mil m²), um nos arredores do Morro do Quilombo e um terceiro na Ilha dos Bagrinhos, todos com saída para o mar. Em relação a bases de apoio e possíveis distritos industriais, são candidatos os municípios de Santos, Guarujá, Cubatão, Bertioga, Itanhaém, Mongaguá e Caraguatatuba.
A meta, de acordo com o coordenador Executivo da Cespeg, José Roberto dos Santos, é que São Paulo consiga pelo menos uma instalação naval. O modelo perseguido é o de Imbetiba, em Macaé. Os estudos preveem que até 2031 haverá necessidade de 13 a 18 berços para operação offshore. Assim, é certo que haverá incentivos fiscais do governo paulista para atração de empresas.
Estímulo à tecnologia
Disposto a consolidar a inteligência do petróleo no estado, o governo paulista vai ter ainda de descobrir uma fórmula engenhosa para estimular seus principais centros de excelência em pesquisa e desenvolvimento. Numa área em que os avanços tecnológicos precisam chegar rapidamente, os recursos necessários se contam às centenas de milhões. E nesse aspecto São Paulo também sai em desvantagem.
Com base em cifras de 2006, a Cespeg levantou que oito instituições paulistas, entre elas USP e IPT, receberam R$ 88,1 milhões para desenvolver trabalhos em óleo e gás. No mesmo perãodo, a UFRJ e a PUC Rio embolsaram, juntas, R$ 117,8 milhões. Por isso, entre as recomendações do estudo está dar alta prioridade para azeitar o repasse de dinheiro via Fapesp e outras agências de fomento.
Da mesma forma, deverão entrar em pauta a estruturação de ações conjuntas com associações empresariais, a fim de buscar na esfera federal a redução do contingenciamento de recursos de P&D por parte da Finep. Nesse sentido, e também para outras finalidades, a Secretaria de Desenvolvimento informou que há planos de injetar algo da ordem de R$ 9 bilhões na Nossa Caixa Desenvolvimento, agência de fomento paulista.