Divulgação Kincaid
Grupo da área de contencioso tributário acredita que incidência de IBS e CBS no afretamento perpetue discussões como do local da operação para recolhimento
Advogados da área de contencioso tributário do Kincaid Mendes Vianna acreditam que a Reforma Tributária, em fase de regulamentação, não resolverá de imediato questões específicas sobre a tributação dos afretamentos. A avaliação é que o período de transição e a incidência do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) nas operações perpetuem discussões como do local de recolhimento, que há décadas gera impasses. O grupo entende que, se o sistema não se harmonizar, podem ocorrer novas rodadas de embates com o judiciário, aumentando a insegurança das empresas devido à falta de clareza sobre a delimitação de onde as atividades devem ser tributadas a partir do novo pressuposto.
O advogado Daniel Tessari ressaltou que a atuação do contencioso não consegue ser totalmente disruptiva devido ao histórico de discussões tributárias não resolvidas. Ele explicou que o afretamento é visto como serviço, a nível municipal, como contrato de transporte, a nível estadual, e que a Receita Federal adota o entendimento que é tudo serviço.
“Vemos que existe um potencial problema entre IBS e CBS (…). Temos preocupação grande de como o afretamento será interpretado. Certo é que vai incidir IBS e CBS, haverá essa tributação”, analisou Tessari, durante o seminário “Reforma tributária: impactos da proposta de regulamentação para o setor marítimo”, promovido pelo escritório Kincaid Mendes Vianna, na última terça-feira (25), no Rio de Janeiro (RJ).
O IBS será submetido a um comitê gestor com a presença de representantes de estados e municípios. Para Tessari, o ideal seria que o afretamento tivesse um estudo de caso para resolver esse conflito. “Temos ganhos importantes com a Reforma. Mas, por conta da generalidade dela, ela não resolve questões específicas — afretamento é isso. O ideal seria um dispositivo claro. Até aqui, imaginamos cenário de insegurança, além da alta carga tributária”, acrescentou.
O projeto de lei complementar (PLP 108/2024) contém uma previsão que permite uma fiscalização compartilhada, com possibilidade de mais um ente sendo titulares credores. O comitê gestor vai ter uma alíquota de referência, porém os entes federativos poderão variar sua carga, sujeitos à fiscalização.
“Vemos avanços. É um movimento disruptivo, mas temos receios e as empresas precisam estar resguardadas em seus contratos por conta da transição que vai vir (…). A legislação não dará todas as respostas para todos os cenários. A tendência é que gere certo contencioso. Falamos que é um período de transição longo, somado a ser um órgão novo”, resumiu Tessari.
O advogado Rodrigo Vieira disse que momentos de transição são desafiadores, mas que abrem oportunidade de refletir sobre o que é possível otimizar. Ele citou a possibilidade de recuperação de créditos a partir da extinção do Pis/Cofins e do ICMS. Segundo Vieira,existem teses visando à recuperação de tributos, com prazo de recuperação de cinco anos. “Existem diversas demandas conhecidas, principalmente relativas ao Pis/Cofins. É um momento de identificação dessa demanda represada e tentar a recuperação, via mandado de segurança”, afirmou.
Vieira também observa que a possibilidade de harmonização do contencioso administrativo, já que existe um grande estoque de processos envolvendo principalmente ICMS e ISS. Os tribunais atuais vão conviver com o novo tribunal, a ser instituído pelo comitê gestor, que virá com novas regras processuais e prazos, gerando uma demanda adicional para empresas lidarem com dois sistemas na fase de adaptação. “Essa transição será um período árduo para as empresas no recolhimento de tributos. Vislumbramos um período provavelmente conturbado e a probabilidade grande de surgirem novas autuações. Vai se fazer necessário às empresas a verificação da conformidade dos procedimentos”, disse Vieira.
O advogado Thalles Niemeyer lembrou que, mesmo com o fim do Pis/Cofins, a possibilidade de precatórios será mantida, sendo um título judicial assegurado contra a receita pública, cujo tempo de recebimento pelas empresas dependerá do ente que fará o pagamento. “A extinção desses tributos não necessariamente quer dizer que [a empresa] não vai receber e que não vale a pena discutir. Cabe a cada empresa avaliar internamente e, se for interessante, não deixar de recorrer ao judiciário”, explicou.
Para Niemeyer, o contencioso tributário no Brasil é um termômetro que mostra muito bem como a complexidade do sistema atual precisa de avanços, melhorias e simplificações para aumentar a eficiência das operações. Ele citou dados conservadores que estimam que o valor do contencioso tributário no Brasil seja em torno de 80% do PIB nacional, contra a média de 1% entre os países membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
O advogado mencionou o grande número de casos de coincidência de cobrança de ISS na navegação de apoio marítimo. “Esse histórico de litígio é um dos objetivos a ser trabalhado para a redução desse tipo de discussão. Ele decorre muito da possibilidade de cada ente (estados e municípios) ter sua legitimidade para cobrar tributos. Fica uma situação de insegurança de fazer uma operação tendo dois ou três municípios, ou estados, querendo tributar usando diferentes tributos”, exemplificou Niemeyer.
O setor espera que a reforma tributária alcance um nível de simplificação que reduza a quantidade de processos nos tribunais. Segundo Niemeyer, o grupo da área de contencioso do Kincaid acredita que o PLP 108/2024, que instituirá o comitê gestor do IBS e disciplinará o contencioso tributário do futuro imposto, ainda sofrerá mudanças no Congresso, a fim de harmonizar melhor a aplicação do recolhimento que virão da nova legislação que está sendo discutida agora.
Fonte: Revista Portos e Navios