Petrobras, Ultra e Braskem investirão U$ 1 bilhão para primeira refinaria 100% renovável do mundo entrar em operação. Preços acompanharão custos, mas demanda fraca ainda é incerta, dizem especialistas

A transformação da Refinaria de Petróleo Riograndense (RPR) na primeira refinaria 100% renovável do mundo, que produzirá combustíveis sem processar uma gota de petróleo, exigirá a construção de quatro novas unidades de processamento, que somarão investimentos de U$ 1bilhão (cerca de R$ 5,5 bilhões ao dólar atual) dos sócios do projeto, Petrobras, Braskem e Ultra.
Os aportes que vão revolucionar o processamento da refinarias serão realizados até dezembro de 2027, afirmou à Brasil Energia o diretor de Processos Industriais e Produtos da Petrobras, William França. A biorefinaria vai produzir combustível de aviação sustentável (SAF), diesel verde (HVO), nafta verde, entre outros produtos.
O bio-óleo, líquido viscoso e escuro, rico em compostos orgânicos, assim como o petróleo, precisa de tratamentos adicionais para ser usado em motores ou turbinas. Para processá-lo, a planta industrial da refinaria passará a ter novas unidades capazes de processar outro tipo de matéria-prima, não fóssil. Uma Unidade de Pré-tratamento; uma Unidade Geradora de Hidrogênio; uma Unidade de Hidrorefino e uma Unidade de Hidroisomerização, informou o diretor.
Ele explica que a Unidade de Pré-tratamento é responsável por preparar o óleo antes das etapas de processamento mais avançadas, desempenhando funções essenciais, como remoção de impurezas e desidratação quando necessário, para evita problemas como corrosão e formação de emulsões e ajustar as propriedades da matéria-prima, como a viscosidade, para facilitar o transporte e o processamento.
Já a Unidade Geradora de Hidrogênio vai gerar a partir do gás natural o hidrogênio que será usado no processo de hidrorrefino. “Vai usar gás natural, reagir com o vapor da água e formar o gás de síntese”, informou França.
Ele acrescenta que a Unidade de Hidrorrefino responde por um processo importante em refinarias que utilizam hidrogênio para melhorar a qualidade dos produtos derivados. O hidrorefino costuma remover impurezas e substâncias como enxofre, nitrogênio e oxigênio, o que é fundamental para atender às especificações de qualidade e reduzir as emissões de poluentes de combustíveis. O processo geralmente utiliza catalisadores para aumentar a eficiência das reações.
Na Unidade de Hidroisomerização, os processos são mais avançados e utilizados para a produção de óleos base que podem ser usados na produção de combustíveis de última geração com o uso de matéria-prima renovável. “O processo é diferente porque não tem torre de destilação para separar as frações. Primeiro, hidrorrefina e depois, separa as frações”, diz França.
Sobre o desafio dos custos maiores de produção, o diretor da Petrobras afirma que “os custos são maiores por conta da matéria prima, mas o preço do derivado também será premium, sem especificar valores, mas dando ênfase aos petroquímicos verdes como “muito valorizados”.
Desafio da demanda
O projeto de biorefinaria 100% renovável, no entanto, é visto por alguns especialistas como um risco devido às incertezas deste mercado. “Acho que eles podem estar se arriscando demais, considerando que há projetos unidades de biorrefino sendo engavetados nos EUA”, comentou um executivo do setor.
Na visão da consultoria Catavento, o Brasil possui, de fato, um relevante potencial para investir em projetos de biorrefinarias, especialmente aproveitando sua sólida indústria de biocombustíveis, que conta com expertise, insumos e recursos humanos qualificados. Os investimentos, segundo a empresa, podem ter papel estratégico para viabilizar a descarbonização de setores de difícil abatimento, como aviação e navegação, que podem se beneficiar do uso de combustíveis renováveis como SAF, HVO e biobunker para atender às suas metas de redução de emissões.
“No entanto, há diversas barreiras para viabilizar esse potencial, principalmente no que se refere à competitividade econômica. O principal desafio é o ‘green premium’ associado a esses combustíveis renováveis, que os torna mais caros em comparação aos fósseis. Como consequência, há uma baixa disposição dos consumidores finais (offtakers) para arcar com esse custo adicional”, afirmam as sócias Clarissa Lins, Bruna Mascotte e Tamara Fain em resposta enviada para esta reportagem.
O diretor da Petrobras avalia que o mercado vai comportar os dois tipos de combustíveis. “Acho que teremos um equilíbrio entre o verde e o fóssil”, diz William França.
Para as especialistas, políticas públicas podem estimular uma demanda inicial por combustíveis renováveis, mas a competitividade brasileira ainda não é garantida. Escala, competitividade e garantia de contratos de longo prazo ainda seguem como os maiores desafios para a consolidação desse mercado.
“No Brasil, a escalabilidade e a viabilidade dos modelos de negócios para produção dos combustíveis renováveis avançados ainda são incertas”, avaliam as executivas da consultoria. Para elas, os combustíveis renováveis terão papel fundamental, mas limitado, na descarbonização global, complementando os esforços de eletrificação.
Fonte: Revista Brasil Energia