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Clippings - 09/10/12

Vendido no Brasil e arrestado na Turquia

O cargueiro São José, batizado assim pela devoção de seu proprietário, o armador Jorge Valentim, sócio da Lyra Navegação Marítima, com sede no Rio, está na iminência de perder o nome de santo e a bandeira verde-amarela tremulando na popa. O navio não pode sair da Turquia, depois que a Justiça do país arrestou a embarcação que, até 2010, exibia a bandeira turca. O graneleiro foi vendido em leilão ao grupo de navegação pela Marinha brasileira.

A história do cargueiro no Brasil começou em 2009. Um incêndio destruiu parte da embarcação na costa brasileira, quando ele ia para a Argentina. A empresa Sotran Denizcilik San. Tic, dona do navio na época, até então chamado de Düden, não atendeu aos chamados para retomar a posse da embarcação e pagar as dívidas, depois que a Marinha brasileira apagou o fogo, retirou os tripulantes e rebocou o navio, feito no Japão em 1981, para o Porto do Rio Grande, no litoral gaúcho.

Assim, a sucata do graneleiro foi a leilão, passando das mãos da Marinha para as de Valentim, por R$ 1,8 milhão. Na segunda tentativa de vender a embarcação. Um negócio com o Estado.

— Não pedi certidão negativa do navio. Comprei um navio da Marinha — afirma Valentim.

O São José foi comprado para ser usado na navegação de cabotagem — exclusiva para navios de bandeira brasileira no transporte marítimo na costa do país. A empresa já tem contratos para esse transporte.

A batalha jurídica na Turquia começou a ser desenhada quando o armador brasileiro decidiu fazer a reparação da embarcação naquele país. Os custos justificaram a escolha. Segundo Valentim, a entrada na Turquia aconteceu sem problemas, com as autoridades marítimas aceitando a documentação expedida pela Marinha brasileira, inclusive o registro feito na Organização Marítima Internacional.

A reparação ficou sob a responsabilidade do estaleiro Besiktas, em Yalova, localidade próxima de Istambul, que trabalhou nele de outubro do ano passado a abril deste ano.

A bandeira na popa começou a correr risco quando o conserto foi concluído. Como a empresa turca, antiga proprietária do navio, faliu, os credores puseram o olho no graneleiro recém-reformado e pediram o arresto do navio para fazer frente às dívidas da empresa. A primeira a aparecer foi da tripulação. Segundo Valentim, de US$ 1 milhão.

— Resolvemos pagar para liberar o navio. Já estávamos fazendo o crédito quando apareceu mais uma cobrança. Mais US$ 1 milhão de dívida do banco estatal, que já tinha sido liquidado. Dessa vez, não pagamos, não sabíamos que outras dívidas poderiam impedir a saída do navio do porto de Istambul.

Diplomacia brasileira na negociação

Assim, começou a via-crúcis do São José para conseguir voltar ao Brasil, ainda com a bandeira brasileira. A Justiça turca executou a dívida dos credores da massa falida da antiga dona do navio e deu prazo de dez dias, contados a partir da última sexta-feira, para que a tripulação brasileira deixe o graneleiro, que voltará, então, a ser turco. E poderá ser vendido para quitar os débitos:

— O comandante já me avisou que só sai preso — diz Valentim.

No Itamaraty, a questão vem sendo tratada pelo embaixador brasileiro na Turquia, Marcelo Jardim, e o Ministério dos Transportes daquele país. Segundo o Ministério de Relações Exteriores, todo o processo burocrático foi cumprido, com as notificações expedidas tanto para empresa dona do navio, como para a Embaixada da Turquia em Brasília. A Organização Marítima Internacional também foi informada:

— Foram cumpridas as exigências internacionais, inclusive com a mudança no registro internacional — afirmou o embaixador Tovar da Silva Nunes, porta-voz do ministério.

De acordo com o embaixador, desde o início do processo o Itamaraty vem acompanhando a questão e atuando em instâncias cada vez mais altas para trazer de volta o navio ao Brasil:

— Temos com a Turquia uma amizade profunda e renovada em vários encontros. Eles têm sensibilidade acima da média para as necessidades brasileiras. Mas, respeitando a independência dos poderes.

O objetivo agora é retardar a execução da ação da Justiça turca, para dar tempo de se dar baixa no registro do navio como embarcação turca. Uma das convenções da Organização Marítima Internacional é sobre o registro e a Turquia é signatária, informou o Itamaraty.

— Assim, acreditamos que a medida permitirá a liberação do navio, uma vez retirado o registro como navio turco — afirmou o embaixador. Tovar Nunes.

Se os esforços diplomáticos e os recursos impetrados pelos advogados do Grupo Lyra não forem suficientes para liberar o navio São José, não haverá retaliação brasileira, disse o embaixador.

— Não é uma desfeita ao Estado brasileiro. Não é um bem da Marinha. Não houve ato hostil ao Brasil. Vamos, claro, oferecer toda a assistência consular.